
Onde foram parar todos aqueles cachecóis? Eram dúzias deles. De todas as cores e medidas, empilhavam as barracas dos camelôs que ocupavam boa parte da larga calçada.
Hoje não vira nenhum por lá. Ainda era dia. O termômetro registrava 34°C. Havia menos colorido na avenida e, antes que chegasse em casa, o Sol já teria se posto.
Embora o calor do concreto aquecesse seu sangue a cada passo que dava, a brisa dissipava idéias pessimistas que atormentavam sua mente. Memórias e sentimentos antigos. Medo. Culpa...dúvidas e certezas à beira da ebulição, da alucinação.
Temia uma recaída. Suportaria a quentura do asfalto, a asfixia da poluição, mas de modo algum novamente arrancaria seu coração e o atiraria para longe. Continuaria buscando, codificando...
Desejava gelo, frio, neve, algo que desacelerasse o ritmo elétrico de seus pensamentos. Queria esfriar o sangue; abrandar o coração ardido. Desejava proteger-se de si mesma. Temia que a felicidade que mal chegava, já tivesse ido embora. Complicava um bocado sua simples vida.
A mesma história parecia se repetir, de tempos em tempos. Sempre que pensava ter achado as certezas, vinham as brumas e dissipavam o caminho. Talvez fosse um sinal para ficar atenta. Talvez fosse uma brincadeira do destino. Talvez nada fosse...
Por que era tão difícil ser simples? Por que felicidade implicava em sofrimento? Estava exausta de tantos questionamentos, de tantas lucubrações, de tanta ausência de respostas, de tantas vindas e idas...
Compreendeu que a única resposta para todas dúvidas e interrogações era a simplicidade. E esta só poderia ser encontrada nela mesma. E nada, nem ninguém, nem mesmo uma incrível sandália nova completaria o que lhe faltava. Ela era completa sozinha. Jamais poderia esquecer isso. Jamais poderia perder seu foco novamente.